sábado, 11 de outubro de 2014

My Way



Metamorfoseando minhas pernas em pedais, coluna em quadro, guidom e membros, fiz-me maquineta velocíssima, cortei as eiras de espaços entrecortados, sobrevoei os tons sibilantes dos conceitos de um ébrio. Pensei, vi, tudo isso que me aconteceu.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Desdenha a escala de Mohs



Tudo é muito, lentes de aumento tem redimensionando as faces do mundo. 
O fio de seda que sustenta os estados, às vezes, tenciona e rebenta. 
As bruscas transformações da mente mergulhando em dualidades. A dureza da cerviz, mineral qual diamante, desdenha a escala de Mohs, por decrescer ao talco em catarse.

Pó, poeira, entre os dedos dum artífice. Virou pó, o orgulho impávido do granito, estilhaçado por um martelo, que sem pestanejar lhe pergunta, agora, pela glória de sua personalidade.

Ah, o exagero das coisas, ah essa mentalidade confusa, ah! E esse medo de que ver as coisas como realmente são não permitirá subsistência.

Há que ser intenso, há que ser único, há que ser insondável, imprescritível, irreconciliável, incognoscível, as cartas de um baralho, os delírios do meu tio, há que ter as futilidades dos Sampaio, há que ser impossível.

Que pode-se existir dentro dos padrões duma cartilha burra, ou em um dos lados do maniqueísmo, que seja a efervescência da água que borbulha  ou a gelidez da inconsciência.

Ah que ser sempre assim, de rompantes em rompantes tomando carona nas ondas do absurdo. Tendo a ignorância dos urbanos por arrogância e, a mesma por sabedoria nos nativos. E com pouco isto tudo vai me matando, e o tédio me é por terrorismo, e se não mato e como, sei que também não vivo. E só vejo mesmo as pedras do caminho passando, e a paisagem se transformando no caminho, e minha mente indo ao encontro do mato, e minhas pernas me mostrando que estou vivo, e os cortes nas canelas ardendo junto aos passos, e, o caminho, e o caminho, caminho.

ESBacellar

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Tabacaria

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Nota - Manifesto do surrealismo - André Breton



É até mesmo permitido

intitular POEMA o que se obtém pela agregação tão gratuita quanto possível

(observemos, faz favor, a sintaxe) de títulos e fragmentos de títulos recortados

dos jornais:


POEMA




Uma risada




de safira na ilha de Ceilão




As mais belas palhas




Têm a cor esmaecida

Na prisão



quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Bucólico

Este meu ser bucólico, tem ojeriza aos podres frutos das cidades; tange-me falas que pregam contra o anti-ócio. Quer, acima de tudo existir no campo, sem os malditos sons de sirenes, alardeadas pelos malditos "cops".
Vive-se aqui, em cadeias, olhando sempre por entre grades, são arames, câmeras, fotos; definitivamente odeio este Big Brother.
Odeio o som maligno das propagandas, e as criaturas que meneiam badeirolas, ao som de "jingles" pedem os meus votos. 
Ah! Quero mesmo correr deste marasmo, e me afastar ao máximo de seres ignóbeis, quero o campo com todas as estrelas, as constelações do cosmos longe das muralhas, do opróbio.
Não me conformo com nada deste presídio. O alimento, companhias, nem dos banhos de sol. Deus me fez livre, filho do vento com as estrelas, o som dos pintainhos no imenso arrebol.

Já dizia A. Campos:



“ (...)Ergo-me de repente todos os Césares!

Vou definitivamente arrumar a mala.

Arre; hei de arrumá-la e fecha-la;

Hei de vê-la levar de aqui,

Hei de existir independentemente dela...”


Não, não! Meu ser não cabe neste cubículo industrial, nem meu espírito se alimenta de lixo; aprecia as matas, os bichos, as cores puras do pardal e, boas prosas com outros seres vivos.
Me valem agora as sábias palavras de Galego, o filósofo concebido em abaíra, plantas e fumaça;
“Faz o que tu queres Bacellar, não há nada que com muita vontade não se faça”.




Eli Bacellar, agosto de 14.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Fábrica de reis


Abrigado em um quiosque, a ler Shakespeare na sementeira,
vi uma cena que me intrigou. Escrevi então, no fundo do livro:

Conduzidos por um comandante assaz hostil,
Os militares subalternos repetem ladainhas de terror,
Endurecendo suas servis com arrogância,
Humilhados pela “prepotência do mando”,
Concebem no interior obscuro de suas barrigas,
A silhueta altiva de pequenos tiranos.
Na ressignificação de suas almas,
Sobrepõe o que quer que lhes resta de calma,
Por irascíveis ordens de comando.

Eis o fim do raciocínio
A exclusão da dúvida
A morte da filosofia.


Eli Bacellar

terça-feira, 5 de agosto de 2014

A morte da convivência plena

A morte da convivência plena nasce com a banalização do verbo. Ora, se com soluços não te pulsa o diafragma golfando palavras, pra que usar os verbos? Por que:
 Duvidar que seu silêncio é sincero?
 Não perceber que o muito que se diz em palavras, despreza a paciência de ler energias e, ver gestos?
Não entender que a incerteza do medo humano, usa erroneamente a divindade do verbo e dos versos?

Que se cuide, pois, de expressar com palavras o que cabe à boca como verbo, e aos gestos o que cabe ao corpo em trejeitos, e à energia o que cabe ao espírito em pulsos.
Que pouco se misture e desperdice as palavras, pelo fim de tudo que há de falso, fingido e indigesto.
 ESBacellar

terça-feira, 29 de julho de 2014

Vaidade de vaidades! Tudo é vaidade!


Eclesiastes 1


1 ¶ Palavras do pregador, filho de Davi, rei em Jerusalém.


2 Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade.


3 Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, que faz debaixo do sol?


4 ¶ Uma geração vai, e outra geração vem; mas a terra para sempre permanece.


5 Nasce o sol, e o sol se põe, e apressa-se e volta ao seu lugar de onde nasceu.


6 O vento vai para o sul, e faz o seu giro para o norte; continuamente vai girando o vento, e volta fazendo os seus circuitos.


7 Todos os rios vão para o mar, e contudo o mar não se enche; ao lugar para onde os rios vão, para ali tornam eles a correr.


8 Todas as coisas são trabalhosas; o homem não o pode exprimir; os olhos não se fartam de ver, nem os ouvidos se enchem de ouvir.


segunda-feira, 16 de junho de 2014

Tropa enfileirada

A tropa passou enfileirada, distante, com mochilas robustas. Deviam estar cheias de víveres. Quiçá iriam a algum lugar diferente, subir uma montanha em busca duma vista bonita. Já cansados de tanto enxergar o atrito irritante dos metais raspados no concreto e asfalto. De repente, desejassem em sua partida, criar uma nova forma de existência que não soasse como sociedade.
Eu vi, vi sim, mesmo ao longe, em seus rostos o tédio.
Também havia um grupo de pássaros juntos. Dois pardos, um que não sei a cor e um de tom amarelo e alaranjado. Brincavam na relva, descontraídos, creio, alheios ao barulho da cidade. Estes não carregavam consigo, mais que os grãos que ciscavam, em seus papos. Com sua inerente capacidade de voar, já deviam ter sobrevoado o mundo. Quem sabe, não tivessem casa ou ninho, pois que, não lhes há lugar mais seguro que o ar.
Descrever a natureza, e sentir com as letras, a pujança de seus ideais, eh como louvar a derrota da matéria pelo espirito. Saber que embora humanos e dos outros seres distintos, não somos, em nenhuma hipótese, a glória falsa da matéria e seus sabores artificiais.
Eli Bacellar

sexta-feira, 6 de junho de 2014

O sim que lhe consome

Surpreende o garoto,e num ato arbitrário, lhe nega o sim que lhe consome.
Sua contradição, confunde a mente do pobre fervente.
Ele quer, a todo tempo fazer-se conhecer por ela, seu libidinoso desejo.
Mas, sempre a vê fugir, no auge da simbiose.
Covarde criatura, relega ao orgulho, à sua qualidade de única, a negação dos próprios instintos.


Eli Bacellar

terça-feira, 3 de junho de 2014

O Sussurro do vento



Tenho escutado o chamado da estrada,
A atração inefável da fuga, que grita meu nome,
A imagem da paisagem que surge e some,
Em uníssono brado, diz: Eli, fuja.
Meu olfato, se desdobrando em lembranças,
Invoca aromas à distância,
Do vapor de brumas naturais.
Na mente, imagens de saudades ancestrais,
O acordar, e ver o teto de outras casas.
Meus pés reclamam de volta a dor dos passos,
Quando, no prazeroso fim da caminhada
Me queixava dos calos, dos calcanhares magoados,
Descrente, ter andado tantas léguas.
O vento agora sussurra meu nome
- E então Eli, vamos onde?
Aguardando a próxima aventura que farei.
Digo então: - Logo logo.


Eli Bacellar

domingo, 27 de abril de 2014

A CONSTRUÇÃO CANSADA

O órgão, num dos lados toca o primeiro acorde grave,
Sons que chocam-se na cúpula e retumbam nos ouvidos,
Arrepios sinistros vibram por toda a epiderme,
A catedral está viva, e o coro entoa o primeiro hino.

A limpidez na voz do solista voa como águia,
De sua laringe jorram latinas expressões difíceis,
Algo como: Miserere tu nobis victor rex,
É misericórdia o som da construção confusa.

Ao olhar do caminhante, eis um prédio distinto,
Forma neoclássica,  paredes seiscentistas
Acústica que ressoa mesmo o nada impecável,

Arquitetada como um forte, fechada ao vandalismo,
Resiste, mesmo hostilizada por saques e agressões,
Há na porta de entrada a fé, nos fundos alicerces Cristo.


Abril de 2014, Eli Bacellar 

sexta-feira, 21 de março de 2014

O CAMINHO DO MATO

Levado pela multidão que corre atrás d'algo,
Observei a manada às voltas indiferente,
Desgarrei-me do que vi ser um rebanho incoerente
E aos matos fui a procura do universo calado.

Já distante dos sons da publicidade louca,
Pude escutar os gemidos ritmados dum corpo doente,
Vi a cura aproximar-se gradativamente
E preencher o fulcros na carne pela cidade gerados

Longe agora do sedentarismo da televisão,
Próximo do calor de irmãs e irmãos
Vivi a liberdade negada pelas redes sociais

Filosofando tudo, trabalhando a mente,
Existi na utopia outrora ansiada virtualmente
Nos recados e status matinais.

Eli Bacelar, março de 2014.



MÃOS DESAJEITADAS

Age como quem à sanha do desejo cede,
Períodos de clausura seu desejo endossam,
A cena  abrupta de quem ao pote corre com sede,
Desajeitadas mãos que quebram todos os copos!

Refaz os passos errantes que trilhou
Ouvindo a zombaria dos fantasmas de sua mente,
Mostram-lhe duramente como errou,
Escarnecem de sua falha reincidente.

Se pudesse voltaria no tempo a todo custo
E ao menos, mais um erro evitaria,
Pegando na estrada o lado diverso.

Refazendo-se, sem mais olhar para o remorso
Ergue-se da auto piedade e do ócio
E nos rios do Eterno bebe águas celestes.

Ele Bacelar, março de 2014.




segunda-feira, 17 de março de 2014

DEITADO NAS PEDRAS



Refletindo no seio das pedras gélidas da serra
E da água que lhe corre substanciosa bebendo,
Notei o anunciar do dia a piados
E a altivez dos sapos fazer a noite ruidosa

Sobre tão perfeita rocha deitado
O foco das estrelas paralisava o meu olhar cadente
Quando, recitando monismo aos astros
Estagnava ante a criação quase onipresente

Alvorece na serra, e o sono confunde a vista
Desfazendo-se lentamente aos goles do chimarrão
Anima os sentidos, esquenta a alma inda fria

Pensamento, ação e nada mais
Partilhando o pão da vida diariamente
Ilumino-me com a essência dos animais.

À natureza curativa
À alegria sorridente dum irmão
Ao oceano que tudo contém sem ser contido
À negação da urbanidade doente. 

 Eli Bacellar, março de 2014.